quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Relógio

A pulseira do meu relógio estragou. É um relógio que eu tenho há no mínimo um ano, mas não lembro bem quando comprei. No visor, ele tem um pequeno espaço em que mostra o dia do mês. Como ele estragou, minha mãe resolveu tirá-lo do meu pulso para mandar arrumar, e me deu, provisoriamente, um relógio velho dela.

O curioso é que, exatamente onde o outro relógio mostra o dia do mês, este mostra os segundos passando. O que acontece é que, por vezes, eu me pego procurando que dia do mês é hoje e vendo os segundos passarem. Até perceber que aquilo não é o dia do mês, nem meu relógio, eu me assusto.

Uma coisa que me veio à cabeça é que, dependendo do ponto de vista, os dias do ano realmente passam na mesma velocidade em que os segundos correm em um minuto, uma hora, um dia. Volto a observar o tal relógio de feirinha, imaginando que aqueles segundos correndo são realmente os dias. E não são?

domingo, 9 de janeiro de 2011

Braz/sil, Brazil ou Brasil?

Ultimamente, um conjunto de fatos tem me incomodado sobre a maneira como as pessoas se relacionam com a cultura de uma forma geral nas capitais do Brasil. A indagação começou com Porto Alegre, onde vivo (e lá se foi meu anonimato geográfico planejado), mas logo percebi que esses "problemas" não estão de forma alguma restritos à minha cidade, e talvez nem mesmo restritos às capitais brasileiras, como disse, assolando todos os municípios do País. Sei que essa incerteza sobre a abrangência do objeto compromete a discussão, mas não estou aqui para achar problemas no problema, e sim examinar o(s) problema(s) principal(is).

Todas as capitais do Brasil, sobretudo as maiores, recebem influências culturais externas. Os sucessos das rádios norte-americanas tocam nos iPods brasileiros, as cores e modelos de roupa usados em Paris acabam chegando aos nossos shoppings e ruas, além de hábitos alimentares, expressões que nascem do inglês, etc. Isso é bastante forte entre jovens com poder aquisitivo, que hoje formam uma grande e importante parcela da população dessas cidades. Essas fontes estrangeiras de cultura acabam cedendo elementos que se misturam às nossas culturas locais e formam um produto novo, que pode ser bastante diferente dos seus dois ingredientes. Pode, mas também pode não ser.

O que me chama a atenção é que isso pode gerar um abandono ou mesmo uma recusa de símbolos culturais da cidade que poderiam servir muito bem para abrigar mesmo essa nova composição sócio-cultural originada da fusão do interno e do externo. Explico melhor. Nossas capitais possuem museus de arte contemporânea, universidades, arenas para shows, espaços públicos de manifestação, avenidas famosas e outros (aliás, o Brasil está bem servido desses, em vários aspectos). Talvez o que nos falta sejam artistas, historiadores, sociólogos, ativistas e arquitetos que se identifiquem com esses marcos. A velocidade com que as "combinações culturais" se desfazem e se refazem nos dias de hoje está muito aumentada, e essa alta velocidade de transformação pode ser a razão pela qual tenhamos esse déficit de identidade cultural. Afinal, mentes pensantes não são geradas em 2 ou 3 anos - o tempo que dura uma moda atualmente -, mas sim em uma geração completa.

O resultado? Não temos eventos ou símbolos unificadores. Temos bandas que tocam o mais puro britpop, mas não temos uma banda que saiba combinar habilmente os ritmos ingleses com a música local. Não temos artistas plásticos que saibam comunicar-se com o público brasileiro (mesmo esse que consome produtos culturais que unem o internacional e o nacional), mas temos vários que sabem agradar a críticos estrangeiros. Ou então pior ainda: nem se tenta imitar, nem mesmo mal, o que se vê em outros países. Consumimos diretamente da fonte, e é isso. Falimos voluntariamente a indústria cultural brasileira.

Dessa maneira, nossas casas de cultura, exposições de arte, monumentos e concertos já não servem mais para costurar entre as classes sociais, e o que ocorre é uma espécie de clivagem imperfeita entre as porções sociais mais altas - que consomem diretamente o que vem de fora - e as mais baixas - criando seus próprios símbolos e produções, que só dizem respeito a eles mesmos -, além de um resíduo confuso entre esses dois setores. Em vez de mesclarem-se os ingredientes, separam-se, e separam-se mal.

Antes que me chamem de purista e carrancudo, dou o aviso: as influências externas não são apenas potencialmente boas, como necessárias em nosso espaço. Quem se fecha a novidades de alhures acaba azedando a produção cultural regional. Todavia, não se pode subaproveitar o potencial de nossas capitais - nossas cidades, nosso povo, o que for - de engolir o estrangeiro e regurgitar o "novo nacional", como sempre fizeram. Não podemos aposentar os prédios antigos dos nossos centros, nossos teatros baratos, nossos cursos de artes cênicas e nossos artistas de rua.

Que falem inglês e sejam globalizados, mas sejam brasileiros ao fim do dia.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Clichês de utilidade pública

Tentamos, mas é difícil. A cada início de um novo ano, nós tendemos a cair nos mesmos clichês dos réveillons passados, como fazer sete pedidos (um para cada bolinha de nhoque ou para cada uva, dependendo da família). O espírito de renovação invade nossos cérebros e nós sentimos que tudo vai mudar no ano que acaba de começar. Perderemos 10 kg, beberemos menos cerveja, iremos mais vezes ao teatro, sorriremos mais. Acontece que, quando esse ano envelhece, nem nos lembramos do que prometemos a nós mesmos (e talvez a Deus, dependendo da pessoa), e isso tudo não serve para nada.

Não que isso seja um enorme problema. É melhor que tenhamos esperança e motivação do que sermos pessoas moribundas e reclamonas, eternamente decepcionadas com tudo à nossa volta. É só uma breve maneira de explicar melhor por que eu criei este blog.

Geralmente, como nos blogs passados, eu começaria com um post de boas-vindas, me apresentando de uma maneira bem curriculum vitae. Não vou fazer isso. Percebi que, quando digo o que eu estudo, minha idade ou a cidade onde vivo, forma-se um molde no qual nem sempre as minhas ideias cabem. Outro hábito comum meu é dizer que eu "estou criando esse blog para mim mesmo, já que ninguém vai ler". É óbvio que isso é só uma maneira de me consolar porque de fato ninguém vai ler; na realidade, eu sempre escrevo para um interlocutor. Uso essas ferramentas da internet, assim como amigos, como meus psicólogos grátis. Então desta vez eu afirmo: estou escrevendo para fora de mim, para esvaziar minha cabeça e para uma pessoa qualquer, num dia de ócio reflexivo, saber do que eu penso e pensar junto comigo.

Não sei bem qual é o objetivo desse blog. Melhor dizendo, ele não tem um objetivo concreto. O que eu sei é que às vezes eu sinto uma grande vontade de escrever alguma coisa e de ser lido, e não tenho um bom canal para fazer isso. Pode ser uma opinião política, um pensamento qualquer sobre a vida (a minha ou a dos outros...), uma estrofe que eu rabisquei no caderno, uma música que eu quero compartilhar. Acho que qualquer uma dessas coisas caberia aqui, então esperem por isso.

Estou em constante mudança, e sim, isso é um clichê que eu escolhi não evitar. Todos nós estamos, na verdade, sempre. Negar isso é loucura. O interessante, e angustiante ao mesmo tempo, é que isso faz com que eu (nós?) não saiba me definir bem. Sou agitado ou tranquilo? Gosto ou não gosto de vinho? Sou contra ou a favor da descriminalização de drogas ilícitas leves? Meu pensamento é itinerante e permeável, um canteiro de obras sempre sujeito a uma tempestade ou a uma greve.

Hoje é dia 3 de janeiro, e esse é o clichê máximo: criar um blog no início do ano. Dessa vez, contudo, não me importo se eu o excluir no dia 5 de janeiro ou daqui a 4 anos. O fato é que ele está aqui, sorrindo para mim e para vocês. Quem disse que relacionamentos curtos não podem ser tão bons quanto - ou melhores que - os longos?

O nome que eu escolhi, Le provoca un tinto?, é uma frase "dialetada" no espanhol de uma determinada região da Colômbia. O significado seria "você quer um café?". Eu gosto dessa frase porque ela me faz rir e me convida a um momento de pausa ao mesmo tempo.

Talvez seja isso que eu queira deste blog.